segunda-feira, 29 de junho de 2015

Arnold Paole: um vampiro de verdade? - Histórias da Mitologia (part. V)

Visum et Repertum (1732) foi a obra que levou o vampiro para o centro dos debates na Era da Razão.Ela tem como palco a região da Medvegia,uma região da Sérvia. Nos relaos ouvidos por Fluchinger,dezessete pessoas teriam morrido no ano de 1731 em um curto espaço de tempo em decorrência dos ataques de um vampiro chamado Arnold Paole. Quando vivo,ele havia sido atacado por um vampiro na Grécia e após a sua morte o ex-soldado retornou como um morto-vivo para molestar as pessoas da sua vila.O corpo de Paole foi desenterrado quarenta dias após a sua morte e, diante das evidências físicas de vampirismo (conservação do corpo,crescimento de unhas e cabelos, e presença de sangue no canto da boca),os homens do local esfaquearam o cadáver,decapitaram-no e queimaram o corpo. 
As dezessete mortes ocorridas mesmo depois da destruição do vampiro foram atribuídas ao consumo de carne de gado vampirizado por Arnold Paole. O que as pesquisas de hoje mostram é que estes casos de mortes associadas a vampirismo podem estar relacionados a um dos vários surtos de peste bubônica que no início do século XVIII assolavam o leste europeu. Esta doença se espalhava rapidamente entre pessoas de convívio próximo e pode ter gerado a impressão de que vampiro havia retornado para levar os seus familiares e amigos para o túmulo. Quanto à aparentemente inexplicável preservação dos corpos sepultados, a ciência mostra que o intenso frio europeu por vezes ajudava na preservação do corpo. 
Da mesma forma,a presença do sangue na boca era resultante da decomposição dos órgãos,liverando fluidos pelos orifícios do corpo. Por fim,pesquisas mostram que algumas funções bioquímicas do corpo humano, como a troca celular, continuam ativas em um corpo, mesmo após a morte. Tal fato explica o crescimento de cabelos e unhas nos cadáveres suspeitos. Essa aparência de crescimento intensifica-se a partir da perda de água do organismo,o que  resulta em uma retração da pele evidenciando os balos da barba,o cabelo e as unhas. A junção de todos os fatores criou o vampiro na mentalidade popular.

Uma vez feita a exumação dos cadáveres e da constatação de características semelhantes às  encontradas no corpo de Arnold Paole, Fluchinger ordenou a destruição de alguns corpos. O relatório detalhado das investigações confirmando a existência dos vampiros foi apresentado ao imperador em 1732. A publicação logo se espalhou pelo continente europeu transformando Visum et Repertum em um sucesso de vendas e alvo de ataques de outros pesquisadores e teólogos da época,dentre os quais se destacaram o francês Jean-Baptiste de Boyer, conhecido como o Marquês d’Argens, e suas cartas Letters  Juives (1736), e o italiano da cidade de Trani e autor do manuscrito Dissertazione sopra i Vampiri (1744).

Ainda que tenham sido escritos por pessoas de reputação diametralmente opostas – o Marquês d’Argens era um famoso libertino do Antigo Regime francês ao passo que Davanzati era uma renomada figura da Igreja Católica Romana – os dois chegaram a conclusões semelhantes no sentido de refutar veementemente as conclusões de Johannes Fluchinger e de atribuir os casos de vampiros do leste europeu como produto de mentes ignorantes e supersticiosas. As duas obras, no entanto,logo foram suplantadas pelo Dissertations sur les Apparitions des Anges,des Démons e des Esprits,et sur les revenants, et Vampire de Hungrie,de Bohême,de Moravie,et de Silésie (1746), de Dom Augustin Calmet, acadêmico católico francês e o mais famoso “vampirologista” do início do século XVIII.

Nesta obra, que se tornou uma das principais refências para a criação das convenções literárias sobre vampiros, Calmet incorporou a preocupação da Igreja Católica com a disseminação das histórias sobre vampiros e decidiu expor seu caráter supersticioso. Objetivando uma análise racional do tema, ele reuniu o maior número possível de relatos oficiais e considerações sobre vampiros da época,incluindo o Visum et Repertum e o Dissertazione sopra i Vampiri. Ele definiu o vampiro como um morto-vivo que abandonava seu túmulo para molestar os vivos, sugando-lhes o sangue. A única solução neste seria localizar a tumba do suposto vampiro,desenterrar o corpo,cortar-lhe a cabeça fora, perfurar-lhe com uma estaca e,por fim, queimá-lo.No entanto, apesar das suas intenções, a profusão de detalhes recolhidos de várias fontes  e a incapacidade de prover alternativas para o fenômeno analisado,levaram Calmet a não refutar de forma decisiva e taxativa a existência dos vampiros. 

Tal fato acabou por alimentar ainda mais o fascínio por estar criaturas,captando a atenção de poetas e escritores europeus. Alimentando pelos debates expressos em documentos,tratados e manuscritos de pensadores e teólogos do século XVIII que o tornou o exemplo mais representativo de várias criaturas folclóricas espalhadas pelo mundo que se alimentavam de sangue humano,o vampiro do leste europeu viu na literatura um convite para transpor suas fronteiras geográficas e culturais e desembarcar nas grandes metrópoles europeias para começar o seu reinado de sangue.




4 comentários:

  1. É incrível como o fato das pessoas não terem conhecimento naquela época, criou tantas coisas na mente deles. O vampiro da primeira foto, nem dá muito medo. Bjus!

    galerafashion.com

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  2. Nossa bem legal essa história, amo vampiros e todo o folclore sobrenatural oriental, mas realmente não conhecia a história do vampiro Arnold Paole! Gostei muito do post! bjs

    De Coturno & Spikes

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  3. Nunca tinha ouvido falar nesse "vampiro" sempre que imagino as pessoas matando algum "possivel vampiro" sinto um medinho/raiva rsrs
    Gostei de saber sobre ele, amei as fotos <3
    ~Querido Coturno~

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  4. Muito interessante seu blog!! você visitou o meu a um tempo atrás, eu peço desculpas por não ter passado aqui antes, andava perdida em meus pensamentos, gostei muito das histórias aqui contadas, com certeza voltarei mais vezes ! se estiver interessada em parcerias entre com contato.

    Att

    Lady Dark

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