sábado, 20 de junho de 2015

Histórias da mitologia - (part. IV) - O vampiro revelado

Em meio à tentativa de se lançar luzes sobre a origem do mito do vampiro, surge uma pergunta: por que dentre todas as representações de criaturas sobrenaturais que se alimentam de sangue humano espalhadas pelo mundo prevaleceu àquela do folclore eslavo? Algumas particularidades da história e da cultura desses povos podem fornecer respostas.
As criaturas sobrenaturais do leste europeu começaram a chamar a atenção dos países da Europa Ocidental a partir do Tratato de Passarowitz de 1718, no qual se estipulava que metade da Sérvia e partes da Bósnia e da Valáquia( hoje parte da Romênia) deixariam de ser dominadas pelo Império Otomano e passariam ao controle da Áustia. Esta nova configuração política abriu as portas de uma região tão próxima, mas ao mesmo tempo tão pouco conhecida pelo público ocidental, situação esta que continuou até o fim do século XX como atestam as linhas iniciais de Drácula,publicado em 1897:
Descobri [ diz o inglês Jonathan Harker a caminho do encontro com o enigmático e desconhecido Conde Drácula] que o distrito por ele nomeado encontrava-se no extremo leste do leste do país, nas fronteiras entre três estados, a Transilvânia, a Mondálvia, e a Bucovina, bem no meio das montanhas carpacianas,uma das mais primitivas e menos conhecidas partes da Eupora.
No entanto,diferente da Ásia e do Novo Mundo (onde também sempre houve relatos sobre criaturas sugadoras de sangue), o leste europeu estava a poucos dias de viagem. Logo,grandes nações europeias como a Alemanha,a França, e principalmente,o Reino Unido tomaram conhecimento de recorrentes relatos sobre vampiros que aconteciam nas regiões sob administração do Império Austro-Húngaro. A consequência foi que, em pleno Século das Luzes, quando a ciência moderna estava emergindo e a razão era a palavra do dia, a Europa se viu assaltada pelo chamado "levante vampírico" do leste europeu,disseminado e popularizado pela emergente imprensa com seus boletins e folhetos. Tal situação levou diversos pensadores renomados do período como Voltaire e Jean-Jacques Rousseau,dentre outros, a se debruçarem sobre o tema,visando demolir o que eles consideravam crenças supersticiosas incompatíveis com o Iluminismo. O vampiro, todavia,é um ser difícil de ser morto.
É interessante salientar neste ponto que,até o início do século XVIII,as narrativas sobre vampiros circulavam na Europa na forma oral,como parte do folclore das regiões já citadas. Os registros escritos sobre vampiros começaram por meio do trabalho de correspondentes e pesquisadores estrangeiros. Devido à proximidade geográfica e cultural com o leste europeu, a Alemanha foi o primeiro país a tratar do tema, buscando explicação para o fenômeno dos vampiros. De Masticatione Mortuorum in Tumulus Liber (1728),de Michael Ranft,e Johannes Christianus Stock abordaram a questão sob um prisma teológico,sem alcalçar maior repercussão. No primeiro,discutia-se impossibilidade dos vampiros assumirem forma física tangível para atacarem os humanos,enquanto o segundo apontava o diabo como fonte dos sonhos com os mortos-vivos. Neste cenário o crescente número de casos levou os dirigentes austríacos a se envolverem no caso, designando uma comissão científica investigativa liderada pelo cirurgião do Regimento de Campo da Infantaria Austríaca Johannes Fluchinger. O resultado desta iniciativa chocou o mundo europeu.


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